sexta-feira, 3 de abril de 2009

Sobre 'approaches': sucessos e desilusões.

Duas crianças estrangeiras, irmãs, provavelmente suecas, ou holandesas, ou húngaras, brincam durante voo. A brincadeira: traduzir palavras de um idioma estranho para o inglês. Tudo feito de maneira comedida e exemplarmente educada. Eram bilingues. Tinham pouco mais de cinco anos e falavam com a mãe no seu idioma e entre si em inglês.

No banco de trás delas, diferentemente, uma criança brasileira, de uns 4 anos, conversa com a mãe em um tom de voz que até o piloto podia ouvir. Em certo momento, ela tenta puxar um papo com as duas crianças estrangeiras: "Oi?". A tentativa se repete a cada 15 segundos durante metade do voo, sem sucesso.

Então ouço: - "Why does she keep doing that, mom?"
E a brasileira: - "Oi?", "Oi?", "Mãe, porque eles não falam comigo?" "Oi?"
A mãe da brasileirinha ainda estimula: "Diga 'Hello' porque elas são estrangeiras, filhinha"
- "Hello?", "Oi?"

Em um momento de sinceridade que parece ser dado apenas às crianças, ouve-se: - "Eu não querrrr falar".

Metade do avião caiu no riso.

Refleti sobre esse nosso hábito de achar que é dever dos outros nos tratarem bem só porque estamos sendo simpáticos, de corresponder às nossas expectativas. Não nos ensinam que nem sempre os outros estão 'a fim', e isso não é de forma alguma um problema. Precisamos aprender a respeitar os outros, seus espaços e formas diferentes de pensar. Eu teria perdido muito menos tempo se soubesse isso antes.

17 comentários:

Marcya disse...

A gente tem muito a aprender com as crianças...
E o seu bracinho, força total?
Estou na expectativa do brinde!

Jane M disse...

A sinceridade do "eu não querrrr falar" é o que muitas vezes esquecemos de informar ao outro, e aí se dá a falha na comunicação.
E assim nasce uma pessoa com medo de ser inconveniente (não, não sou eu tá?).

Bjos

Paula Barros disse...

Ai, passei por isso, estou passando, e dói, simplesmente dói. Por mais que a gente saiba do direito do outro, que queira entender.

abraços

Maíra Bezzi disse...

É uma coisa bem de brasileiro isso mesmo. Inclusive acho que tem a ver coma baixa auto-estima geral que reina neste país... sei lá! Gostei da sua reflexão!
bj

Yu disse...

"Nosso hábito de achar que é dever dos outros nos tratarem bem só porque estamos sendo simpáticos, de corresponder às nossas expectativas"...

Bom...
Eu não diria exatamente que nosso "hábito" seria o de achar que é DEVER do outro nos tratar bem; mas sim que nosso hábito é o de ficar à expectativa de uma resposta igualmente simpática, por uma simples questão de modos e educação...
e talvez, depois disso, tomar um possível próximo passo em rumo
a um próximo nível, menos superficial, de se relacionar com a pessoa... puxando papo ou qualquer coisa que seja...

Só que quando ele/ela não "tá a fim", ou quando a gente não se satisfaz APENAS com simplesmente uma resposta / gesto educado de volta da outra parte. E a gente começa a EXIGIR...
Aí, temos um impasse, tão comumente presente em situações de nosso dia-a-dia...

Já perdi a conta das vezes em que parei para pensar, e percebia o quanto eu ficava chateada com meus melhores amigos, porque me sentia em segundo plano na vida deles.
Para mim, eles estavam em primeiro plano em minha vida, tudo que eu fazia eu me lembrava deles, me preocupava com eles, e ia atrás deles
Mas para eles (pelo menos no meu ver, daquele tempo), (eu achava que) eu jamais estava em primeiro plano. Porque eles não faziam o mesmo que eu fazia por eles.

Daí vem o sentimento de rejeição e esquecimento e mágoa...

Mas com o tempo, amadurecendo, a gente vai chegando à conclusão de que não somos o centro do mundo, vamos deixando de lado nosso egocentrismo mesquinho (pelo menos deveríamos assim fazer...=P )
E aceitando o fato que existem pessoas que são mais ‘dedicadas’ e outras mais independentes. E que só porque vc se importa com alguém, que o fato de vc gostar dela, não implica que ela tenha que ‘responder na mesma moeda’, na mesma intensidade...

Sentimentos, gestos gentis, e até mesmo o próprio amor, são doados. E não ‘dados’ esperando algo em troca...

Só que nem todos chegam a essa conclusão, e poucos têm um bom-senso e sensibilidade suficiente para não esquecer de lembrar desses pequenos detalhes da vida...


=]


bjoooooo

PS. agora não pode reclamar q não comentei... XD hehhehehhehe ^^ adorei o assunto...

Silvio Garcia Martins Filho disse...

Marcya,
O braço tá melhor a cada dia que passa, obrigado! (mas a gripe que me pegou agora tá chata, viu?)

Jane,
Esse silêncio do incomodado também estimula muitas vezes o inconveniente. COmunicação é uma coisa complicada, né?

Paula,
Acho que isso sempre vai doer, né? Mas cada vez dói menos. Quando a gente vai entendendo certas coisas, fica mais fácil aceitar.

Yu,
A retribuição de respostas simpáticas por mera educação é suficiente para um primeiro contato. Mas não é isso que eu espero de uma relação mais duradoura. Por isso me pergunto: pq não podemos ser educados e sinceros desde o começo? Não estou a fim de conversar não quer dizer nada a respeito do outro, mas sim que o seu emissor não está a fim, e ponto.
Também fui muito assim como vc. Ficava magoado porque as pessoas não retribuíam minhas gentilezas e cuidados. Mas, como vc mesma disse, as pessoas são diferentes. Concluí há pouco tempo que as melhores relações (sejam quais forem) são as que há doação sem espera de retribuição. Nas minhas melhores amizades eu sempre sinto que estou em dívida. E ouvi há pouco tempo de uma grande amiga que ela sentia o mesmo em relação a mim. Foi incrível concluirmos que os dois nos sentíamos assim. Sempre achando que deveríamos dar mais, pois nos era dado tanto... incrível isso, né?
E obrigado pelo comentário! Espero que volte mais vezes.

Beijos,
S.

Felipe Rosa disse...

Sei não, viu.

Já pensei nisso várias vezes. Uma coisa que eu não consigo vislumbrar muito bem é por que o estado "normal", sem motivos extra, seria o da "não comunicação", por que a predisposição seria de não responder, sabe? Não consigo pensar isso de forma tão despretensiosa, como um "não se está a fim". Continuo tendo uma antipatia pelas criancinhas húngaras.
Acho que a predisposição é sempre do afeto, do contato com o outro, do que nos faz humano. Quase sempre a recusa é sustentada por outras variáveis...

Blog Dri Viaro disse...

Oi to passando pra conhecer o blog
bjs otimo final de semana

Blog Dri Viaro disse...

isso mesmo hehehe
bjs

Anônimo disse...

Olha querido,
me senti igual ao menino brasileiro ao ler o título do seu blog, porque francês falado direitinho só sei quando tenho que ser "a Carmem" da ópera de Bizet.
Eu querrrr falar e pior sou mineira, falo mais que pobre na chuva.
Seu blog é bem legal.
Abraços.

Mari Ceratti disse...

Post novo, please! ;-)

Adriane disse...

Olá...gostei do seu blog...cheguei aqui através do blog "Mulheres impossíveis"....legal o post do "Pequeno Príncipe"....estarei sempre aqui....bjos....

Princess Deluxxe disse...

peninha da criança brasileira. as crianças funcionam em outra lógica. não é só a questão da educação q recebem. é como a reação sincera do 'não quero falar'. a sinceridade da criança de tentar contato com a outra.
=)
vai ver fui muito mal-educada, rsrsrsrs
bjoss

Silvio Garcia Martins Filho disse...

Cheio de idéias, tristes inspirações... mas está faltando energia pra vir aqui postar.
Prometo logo vir com uma renca!

Beijos e obrigado pelos comentários. :)

BG. disse...

É pq não temos a cultura do não, nem para falar, nem para ouvir. "Não" é obsceno, absurdo, imoral.

Por isso que grande maioria das pessoas que se dizem "sinceras" e "honestas", usam essa "proteção" para dizer o que quiserem quando quiserem... e se assustam quando se deparam com um momento assim.

Só para constar, adoro seus posts, Silvinho! Aquele que vc citou o trechinho de O Amor nos Tempos do Cólera me deu ainda mais vontade de ler, eu comprei em espanhol e até hj não li... rs Tô lendo o Doce Cuentos Peregrinos.

abração! =)

Wilson Granja disse...

humm... eu não querrrr comentarrr... rs
brincadeira!
faz um certo sentido, mas creio ser mesmo uma questão cultural. há que se refletir muito para "decidir" se é melhor ser como eles ou como somos mesmo. Mais fácil é, com certeza ;)

Alexandre Correia disse...

Olá Mefisto!

Esta história já a vivi tantas vezes que perdi a conta. É verdade que por vezes, para sermos agradáveis e correspondermos com simpatia acabamos por ser vítimas de conversa mole que dispensávamos, mas mesmo assim eu continuo a não ser capaz de não corresponder, convicto que é muita crueldade magoarmos os outros e fazê-los sentir desacreditados na sua capacidade de estabelecer comunicação. Para além disso é uma arrogância. E quando sucede entre crianças, pode ser bem marcante...
Quando diz que as melhores doações são aqueles em que nos concentramos na doação sem esperar pela retibuição lembra-me que até há alguns anos não havia mês em que não organizasse pelo menos dois grandes jantares em minha casa. Era uma forma de reunir os amigos e como adoro cozinhar, quanto mais melhor. Cheguei juntar cerca de 60 num só jantar e era raro que não fossem à volta de 30. Até que um dia pensei num pormenor que sempre me tinha escapado: as minhas festas tinham-se tornado num ponto de encontro quase que público, mas eu nunca ia a outras festas senão as minhas. Decidi parar e esperar que me convidassem. Nunca mais fui a uma festa... Continuo a cozinhar e continuo a perguntar-me se vale a pena dedicarmo-nos aos outros sem receber nada em troca; mas encontro sempre a mesma resposta e embora tenha terminado com os jantares, sei que nunca deixarei de corresponder com simpatia, nem de ajudar sem retorno. Porque também sei que não me custa nada e sei que às vezes trocar umas palavras ou fazer até um comentário simpático pode fazer toda a diferença para o dia de alguém, para que a sua vida seja melhor. Uma das suas comentadoras referiu a carência de auto-estima e outra diz que "e assim nasce uma pessoa com medo de ser inconveniente" — uma coisa é reflexo da outra e é tão fácil mudar isso...

Um abraço,

Alexandre Correia

PS - Já estive duas vezes em Florianópolis. Adorei a sua terra!